Pode-se dizer que durante todo o governo de João Goulart, entre 1961 e 1964, esteve presente a oposição a esse regime liberal-democrático. A conspiração contra Jango, que iria desembocar no golpe de Estado, não nasceu em 1964: ela já existia desde a própria posse desse presidente, que teve de ocorrer sob a "solução de compromisso" do Parlamentarismo. Isso, porque o posicionamento político de João Goulart - vindo do trabalhismo1 - era visto com reservas pelos políticos e militares comprometidos com as ideologias de caráter liberal-conservador e de direita. Assim, desde sua subida ao poder, Jango já enfrentaria resistências, tendo seu governo limitado pelas decisões do Parlamento até 1963.
A agenda das Reformas de Base que o então presidente lançaria em 1962 pode ser vista como um dos catalisadores para o desfecho do golpe, pois seria encarada por essas elites como um primeiro passo para a instauração do comunismo no Brasil. Embora Goulart tivesse reiterado a ideia de que a reforma agrária, urbana, fiscal, bancária, universitária e administrativa que ele planejava realizar seria um modo de estimular o capitalismo no país, essas medidas foram lidas como uma ameaça revolucionária, comunizante, e utilizadas como pretexto para o golpe. Assim, o golpe de 1964 pode ser visto como uma medida que visava impedir a reforma da Constituição e a implantação de projetos como a ampliação do corpo eleitoral do país, a nacionalização dos bancos estrangeiros, a realização da reforma agrária nas terras mais valorizadas do território nacional, etc.
No período que antecede o golpe militar, surgiriam várias entidades anticomunistas que contribuíram fortemente para o crescimento da mobilização conservadora contra o reformismo de João Goulart. As organizações mais influentes foram o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), pois eram sustentadas por empresários e propagandeavam amplamente as vantagens dos ideais liberais e da livre-iniciativa do mercado em detrimento do comunismo e da intervenção do Estado na economia. Para tanto, essas organizações financiavam diversas publicações, filmes, palestras, etc., lançando mão da grande imprensa para criar uma espécie de "guerra psicológica" contra o "perigo do comunismo" e sua "ameaça" à democracia, à propriedade privada e à liberdade individual.
O Comício das Reformas, realizado por João Goulart no dia 13 de março de 1964, tinha como objetivo anunciar a realização das Reformas de Base, mas acabou se transformando em um dos eventos determinantes para que os golpistas passassem a conspirar abertamente contra o governo. Após 3 horas de discursos inflamados, Jango proclamou que iria realizar a nacionalização das refinarias particulares de petróleo, dentre outras medidas reformistas que foram vistas pela direita como o prenúncio da subversão da ordem. Além disso, pouco antes da fala do presidente, Leonel Brizola também iria suscitar a revolta da elite conservadora ao defender a realização de um "governo nacionalista e popular".
Outro fator que contribuiria para desencadear a reação aberta em relação a Jango seria a rebelião protagonizada pelos marinheiros em 26 de março de 1964. Diante desse protesto por melhores condições de vida e contra a truculência dos oficiais, o ministro Sílvio Mota enviou um grupo de fuzileiros para prender os marinheiros. Entretanto, eles não cumpriram essa ordem e ainda aderiram aos revoltosos. Ao anistiar os protestantes e, assim, desconsiderar o princípio da defesa da disciplina e hierarquia que era defendido pela alta oficialidade da Marinha, João Goulart desagradou setores do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Assim, desde o começo do mês de março de 1964 o governo de Jango já vinha enfrentando resistências por parte da própria sociedade civil. Segmentos das classes médias e da burguesia - que se proclamavam na defesa da propriedade, da fé religiosa e da moral - saíram às ruas em diversas capitais para levantar sua principal bandeira: a do anticomunismo. Dentre essas manifestações civis, merece destaque a chamada "Marcha da Família com Deus pela Liberdade", realizada em São Paulo. Esse movimento reuniu cerca de 500 mil pessoas e contou com o apoio de movimentos femininos, setores da Igreja Católica, da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), etc. Nesse sentido é que alguns historiadores têm optado por falar em um "golpe civil-militar", uma vez que se reconhece a participação de setores da sociedade civil na articulação do golpe, sobretudo no que se refere à atuação de empresários brasileiros na conspiração. Assim, tais demonstrações públicas de repúdio ao governo Jango contaram com a presença de parte da classe média brasileira, o que contribuiu para criar uma atmosfera sócio-política favorável à intervenção militar.
Também é necessário recordar que naquela época o contexto mundial estava marcado pela Guerra Fria, isto é, pelo embate entre zonas de influência capitalistas e comunistas, lideradas respectivamente pelos Estados Unidos e pela União Soviética. Esse quadro geopolítico também interferiu significativamente na situação política brasileira, pois os norte-americanos não hesitaram em apoiar golpes militares na América Latina para que seus aliados tomassem o poder e garantissem o alinhamento desses países ao bloco capitalista. Assim, foi intensa a atuação da embaixada dos Estados Unidos no combate político do governo João Goulart. Entidades políticas e sindicais que realizavam uma oposição sistemática ao mandato de Jango eram contempladas com amplos recursos financeiros do governo norte-americano. Além disso, os EUA disponibilizaram a própria Marinha do país para dar suporte ao golpe de 64 através da chamada Operação Brother Sam. Caso ocorresse uma guerra civil no Brasil por conta da tomada do poder pelos militares, os norte-americanos já haviam planejado um enorme aparato bélico para oferecer apoio logístico, material e militar aos golpistas.
Após a própria imprensa ter pedido abertamente a queda do governo, ficou claro que já estaria armado o cerco para a deflagração do golpe de Estado. Em 31 de março de 1964, o jornal Correio da Manhã publicaria em seu editorial a seguinte frase: "O Brasil já tolerou demais o atual governo. Basta!" E na madrugada daquele mesmo dia o golpe teve início, ocorrendo a partir do deslocamento de tropas do estado de Minas Gerais em direção ao Rio de Janeiro, onde Jango se encontrava no momento. Esta iniciativa, liderada pelo general Olímpio Mourão Filho, tinha sido aprovada pelo governador de São Paulo. Os golpistas provenientes de Minas Gerais aguardavam, no entanto, a decisão do comandante do II Exército, o general Amaury Kruel, que até aquele momento hesitava em aderir a uma ação conjunta contra o I Exército, sediado no Rio de Janeiro. Apesar de ter sido um homem da confiança de Jango, Kruel decide romper com este e ordena que as tropas de São Paulo se movam para o Rio a fim de se juntar às comandadas pelo general Mourão. O Exército era dividido em facções, de modo que existiam as alas golpistas, mas também havia setores legalistas, fiéis ao governo. Contudo, o presidente decidiu não convocar os legalistas para impor uma resistência ao golpe. A ausência de reação por parte de João Goulart selou o destino de seu governo, que caiu sem a ocorrência de uma guerra civil. No dia 4 de abril, o presidente deposto rumaria para o exílio no Uruguai.
Na madrugada do dia 2 de abril, o próprio Congresso Nacional legitimaria o golpe de Estado, declarando vago o cargo da Presidência da República. Nota-se, então, que também havia forças políticas conservadoras na esfera do próprio Congresso, o qual imediatamente empossaria o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, como presidente da República. Mas este último representaria somente uma transição, pois em seguida o general Castelo Branco é que se tornaria o novo presidente brasileiro.
Com o governo Castelo Branco, se inicia um processo de aprofundamento do autoritarismo que iria extinguir a democracia brasileira e interromper o processo político de crescente mobilização popular que vinha sendo gestado até 1964. Assim, como alguns historiadores propõem, a derrubada de Jango foi uma ação preventiva, que tinha como objetivo evitar um processo de radicalização esquerdista que poderia acabar beneficiando os comunistas, segundo a visão da época. Com a Ditadura Militar, seria implantado um projeto político-econômico que romperia com a aliança entre desenvolvimento econômico e concessão de direitos aos trabalhadores. Ou seja, a ditadura militar privilegiaria um processo de "modernização-conservadora", a partir do qual a busca do desenvolvimento econômico do país ocorreria juntamente com uma forte e violenta repressão aos movimentos sociais. O golpe militar de 1964 abriria caminho para a ditadura mais truculenta já instalada na história do Brasil.
1: Grosso modo, o trabalhismo pode ser definido como um conjunto de ideias e práticas políticas que se centrou sobre os direitos do trabalhador e que foi representado pelo PTB (Partido Trabalhista Brasileiro).
(FAAP) Um golpe de Estado interrompeu o mandato presidencial de:
(Mackenzie 97) Com a renúncia de Jânio Quadros, setores militares resolveram impedir a posse do Vice-Presidente João Goulart. O Congresso e vários segmentos sociais, tendo à frente o governador Leonel Brizola do Rio Grande do Sul, desencadearam a mobilização popular e, diante da ameaça de guerra civil, contornou-se a questão com a emenda parlamentarista.
Tais fatos dizem respeito a um importante acontecimento histórico dos anos 60, denominado:
(UFRS) Considere as seguintes características do Regime Militar instaurado no Brasil em 31 de março de 1964 e assinale a(s) correta(s).
(UEL) Em 1964, houve uma ruptura institucional no Brasil com o golpe militar que implantou o regime autoritário por um período de mais de duas décadas. Com base nos conhecimentos referentes a este período histórico, assinale a afirmativa correta: